“Tá nascendo, doutora” 

16:45 de um dia de mutirão: sábado ensolarado,  atendimentos finalizados. “Pôr do sol no mirante hoje”.

O grito de ajuda me sacode instantaneamente da cadeira. Por instinto, pego um par de luvas e corro pra recepção. “Tá nascendo, doutora”. E sou direcionada pra casa vizinha muro a muro à unidade de saúde. 

Olhar desesperado de um pai. Uma mãe em pé na garagem, com as mãos a postos pra receber seu filho que decidiu vir ao mundo ali. Providencio uma toalha, um cobertor, e o coroar imediatamente se faz em nascer. 

Não os conhecia. “Seriam pacientes de quem?” Coleta rápida de dados. Risco habitual. Sem doenças infecciosas. O parto deles. 

Vamos pra cama. O bebê ainda unido à sua mãe pelo cordão umbilical. “E agora? Não desespera. Voce já fez isso tantas vezes no hospital como interna. É simples. Não desespera. Apgar. Relógio? Que horas são? Meu Deus, essa criança merece ter um mapa astral”. Golden hour. Vamos lá. Aquece a cabecinha. Uma touca. O enxoval prontinho e com cheiro de bebê. Pele a pele. A boquinha instintivamente busca pelo peito materno. Golden hour! A ambulância já está a caminho. Tudo sob controle, exceto o meu coração acelerado.

O pôr do sol no mirante fica pro próximo sábado. 

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